O mercado do feijão carioca atravessou uma das semanas mais travadas do ano, marcado por colapso da demanda, queda contínua nos preços e acúmulo crescente de oferta não absorvida. Segundo o analista Evandro Oliveira, de Safras & Mercado, o ambiente geral foi de profunda apatia, com ausência quase total de compradores nos pregões da Bolsa de São Paulo e um volume significativo de mercadoria encalhada.
“A demanda inexistente e o comportamento defensivo dos compradores foram os pontos centrais da semana”, afirma Oliveira.
A maioria das empresas antecipou suas compras antes do feriado de 9 de julho, resultando em um esvaziamento completo da demanda nos dias seguintes. Corretores insistiram, ajustaram pedidas, abriram margem de negociação, mas ouviram repetidamente o desinteresse do lado comprador. Essa inércia, segundo o analista, indica não apenas uma falta de necessidade, mas também um novo padrão de reposição: mais espaçado, cauteloso e descolado dos ciclos tradicionais.
A queda de preços foi generalizada e sem validação comercial. O feijão extra (notas 9 e 9,5), que já foi negociado por até R$ 305/sc CIF SP, recuou para R$ 230–245/sc, com indicações FOB entre R$ 242–246 (SP) e R$ 219–222 (Noroeste de MG). Já os grãos de padrão intermediário (8 e 8,5) ficaram entre R$ 190–220 CIF SP, enquanto os feijões comerciais (7,5 e 8) mergulharam para R$ 140–180/sc. “A maioria desses valores, porém, permanece nominal, ou seja, sem confirmação por vendas efetivas”, explica.
Apesar do ambiente de preços mais baixos, a oferta continuou crescendo, com entradas regulares de produto irrigado de Minas e Paraná. Em alguns dias, a Zona Cerealista operou com mais de 10 mil sacas acumuladas.
“Mesmo com feijões de diferentes qualidades e origens disponíveis, o mercado não reagiu”, destaca o analista. Diante da incapacidade de escoamento pelo canal tradicional, corretores passaram a considerar parcerias para armazenagem ou vendas fora da bolsa, muitas vezes por amostra.
Vendas com embarques programados têm ganhado espaço, mas continuam tímidas e insuficientes para gerar tração. As negociações se concentram em volumes mínimos, geralmente para blends, e feitas de forma direta, fora do pregão.
A perspectiva permanece negativa no curto prazo. “Não há vetores de reação à vista. O mercado depende inteiramente da retomada do canal varejista, que ainda opera abastecido e sem sinal de reposição. Os preços atuais, embora tecnicamente baixos, não são suficientes para ativar a demanda. Ao contrário, criam desestímulo para o produtor, especialmente nos feijões mais fracos, que agora enfrentam propostas abaixo da linha de viabilidade”, afirma o analista.
Falta de giro no varejo é gargalo central do feijão preto
O mercado do feijão preto também encerrou a semana sob um cenário de total paralisia comercial, sustentado por demanda inerte, preços nominais e incapacidade de reação do varejo. A ausência de tração nas negociações, especialmente na Bolsa de São Paulo, refletiu o comportamento defensivo dos compradores, que se mantiveram afastados mesmo diante de ampla oferta e corretores abertos à negociação.
“O relato recorrente entre os vendedores foi de ‘não estou precisando’, revelando um mercado profundamente travado”, aponta Oliveira.
Os preços operaram apenas como referência, sem validação concreta de negócios. O feijão preto maquinado e ensacado, preferido por empacotadores com espaço limitado, foi cotado entre R$ 190 e R$ 200/sc CIF SP, mas com vendas muito pontuais. Já as cargas a granel, destinadas a grandes empacotadoras com maior capacidade de estoque, giraram entre R$ 170 e R$ 180/sc CIF SP, com lentidão acentuada.
As cotações regionais FOB reforçam a dispersão e a fragilidade da liquidez: Sul do Paraná, R$ 126–132/sc; Oeste Catarinense, R$ 127–130/sc; Curitiba (PR), R$ 138–141/sc; Campos de Cima da Serra (RS), R$ 143–145/sc – com produtores pedindo acima de R$ 150/sc; e interior de São Paulo, R$ 161–164/sc.
Apesar dessas indicações, a maioria dos preços segue abaixo do mínimo oficial, comprometendo a rentabilidade e desestimulando o plantio da próxima temporada. “O setor produtivo, especialmente no Rio Grande do Sul, mantém firme resistência em aceitar novos recuos, mas a ausência de liquidez mina o poder de barganha”, explica o analista.
Problemas no varejo agravam a situação. Mesmo com promoções agressivas nos supermercados, não houve resposta do consumidor final, travando o giro e criando gargalos para os empacotadores, que operam com margens cada vez mais comprimidas. Com exportações ainda pouco representativas, o escoamento segue quase inteiramente dependente do consumo interno, que não apresenta sinais de reação no curto prazo.
No Rio Grande do Sul, a colheita foi tecnicamente finalizada, mas as chuvas comprometeram parte das lavouras tardias, causando perdas por germinação e queda de qualidade. O preço médio estadual caiu 14,04%, para R$ 184,29/sc, com relatos de negócios pontuais chegando a R$ 120/sc.
Conforme o analistas, a perspectiva para os próximos meses é de estabilidade com viés de alta, sustentada por três fatores: os preços já operam no que o mercado considera piso técnico; o início da entressafra nacional, com colheitas apenas residuais até dezembro; e a expectativa de corte de área para a safra 2025/26, dado o desalento do produtor.





