Marcado por uma estagnação prolongada no consumo e pelo acúmulo de estoques, o ano de 2025 consolidou um ciclo de profunda segmentação do mercado brasileiro de feijão. A avaliação é do analista de Safras & Mercado, Evandro Oliveira, ao expor a retrospectiva especial do setor.
Para ele, a distância entre os produtos premium e os comerciais aumentou, evidenciando um ambiente em que a qualidade, e não apenas o volume, tornou-se o principal vetor de formação de preços. “A dinâmica combinou demanda interna retraída, vendas externas como válvula de escape parcial para as variedades exportáveis, retenção de oferta para lotes de padrão superior e deterioração contínua da qualidade sob influência climática”, analisou.
Conforme Oliveira, o mercado iniciou o ano sob efeito direto do fim da colheita da primeira safra 24/25, marcado por oferta crescente de produtos intermediários, escassez de lotes extra e liquidez seletiva. Em janeiro, a forte segmentação entre classes ficou evidente: o carioca premium operou com firmeza em São Paulo, com referências em R$ 245 por saca por três semanas consecutivas, enquanto os padrões comerciais acumularam encalhe. A chuva intensa deteriorou o padrão no Paraná, Minas Gerais e Goiás, elevando custos de beneficiamento e restringindo a disponibilidade de produto realmente nobre.
“A qualidade passou a ser o grande divisor de águas do mercado já no início do ano”, avaliou o analista.
O feijão preto manteve oferta confortável, sustentado pelo excedente interno e pela continuidade das exportações, mas sem reação do consumo doméstico, abrindo o ano com baixos volumes de negócios e cotações pressionadas. Segundo o especialista, fevereiro trouxe o esboço de entressafra no carioca, sustentando os preços do extra e mantendo travamento nas negociações dos padrões comerciais. No preto, a expectativa exportadora compensou parcialmente a retração doméstica, embora tarifas argentinas e maior oferta regional tenham limitado avanços reais.
“Março consolidou a assimetria estrutural: o carioca premium se valorizou por escassez crítica com o fim da colheita, enquanto o produto comercial permaneceu encalhado; já o feijão preto operou praticamente à margem da curva altista, estável e dependente de embarques externos para evitar quedas ainda maiores”, resumiu.
Na avaliação de Oliveira, o segundo trimestre representou a transição para a fase mais letárgica do ano. De abril a junho, o mercado foi marcado por liquidez mínima, demanda retraída (tanto consumidora quanto industrial) e preços nominais sustentados apenas pela escassez de produto de maior qualidade.
De acordo com o cenário descrito por Oliveira para a segunda safra 2024/25, houve avanço, mantendo oferta suficiente para evitar estresse, mas incapaz de reanimar o mercado. Oscilações climáticas persistentes deterioraram a qualidade e reforçaram o prêmio para grãos de escurecimento lento, porém a perda de tração do varejo, abastecido e pouco responsivo, manteve elevado o diferencial entre o extra e o comercial, ainda que com baixa fluidez.
“O segundo trimestre fixou um ambiente psicológico de excesso de mercadoria intermediária e ausência total de gatilhos de consumo”, resume o analista.
Ainda segundo o especialista, no feijão preto, a apatia foi contínua. Junho consolidou pressão baixista, com estoques elevados, paralisação de compradores e negociações abaixo do preço mínimo, enquanto as exportações já não compensavam o enfraquecimento da ponta consumidora. Assim, o segundo trimestre cristalizou um mercado sem tração.
Aprofundando essa lógica, o terceiro trimestre revelou o ponto de inflexão do ciclo. Julho trouxe colapso generalizado da liquidez e hibernação do varejo: compradores se afastaram e os indicadores tornaram-se essencialmente nominais. Agosto manteve esse tom, mas setembro sinalizou recuperação no carioca, impulsionada pela retomada gradual da reposição e pela continuidade da escassez de notas elevadas, sugerindo reposicionamento altista mesmo diante da lentidão comercial.
No feijão preto, a segunda safra seguiu pesando, conforme análise do especialista, os estoques recuaram lentamente, mas o mercado doméstico permaneceu incapaz de absorver a oferta.
No quarto trimestre, as tendências se consolidaram na avaliação de Oliveira. Segundo o analista, outubro e novembro reforçaram a firmeza nominal no carioca premium e a estagnação do preto, enquanto dezembro cristalizou o padrão dominante do ano: demanda fraca, seletividade extrema, retenção de oferta de qualidade superior e letargia típica de fim de ciclo. O varejo seguiu inerte, a reposição mínima sustentou apenas movimentos pontuais e a necessidade por grãos nobres não encontrou elasticidade suficiente para destravar volumes relevantes.
“Foi um ano de menos volume e mais seletividade, com o mercado operando sustentado pela escassez de qualidade, não pelo consumo”, conclui Oliveira.
Em síntese, 2025 foi marcado por um prêmio estrutural para o produto nobre no carioca e por pressão contínua no feijão preto, altamente dependente das exportações. A desarticulação entre oferta e demanda, somada à deterioração de padrão, ao varejo pouco reativo e à ausência de estímulos reais ao consumo, desenhou um mercado tecnicamente firme no topo e cronicamente pressionado na base.
“O setor encerra o ano entrando em 2026 com as mesmas questões que atravessaram todo o ciclo: quem consumirá os volumes comerciais? Quem pagará pelo prêmio do extra? E quando a demanda interna deixará de ser uma promessa e voltará a ser uma variável?”, questiona o especialista.
Luciana Abdur – luciana.abdur@safras.com.br (Safras News)
Copyright 2025 – Grupo CMA
TUDO SOBRE O AGRONEGÓCIO
GLOBAL EM UM SÓ LUGAR




