Porto Alegre, 5 de janeiro de 2024 – A tendência para o trigo no Brasil em 2024 é de preços mais firmes. Segundo o analista de SAFRAS & Mercado, Elcio Bento, essa percepção se baseia nas mudanças verificadas no quadro de abastecimento interno. No ano passado, houve queda acentuada, de 25,3%, na comparação com 2022.
Depois de duas safras com excedentes exportáveis no Rio Grande do Sul, a produção de 2023 – que terá influência sobre o mercado doméstico até meados de agosto de 2024 – sofreu grandes perdas devido a adversidades climáticas. No ciclo 2022/23, de agosto a julho, os gaúchos tinham grãos que superavam a demanda de suas indústrias em cerca de 4 milhões de toneladas. Com isso, além de escoar grandes volumes ao exterior e ao nordeste brasileiro, foram a principal alternativa do grande centro moageiro nacional, o Paraná, para compensar as perdas da produção local.
Na safra do Rio Grande do Sul, colhida no último trimestre de 2023, os grãos com qualidade suficiente para serem destinados à farinha, não atenderão a demanda dos moinhos do estado. Para manter o ritmo de moagem, a necessidade de compras internacionais fica entre 750 e 950 mil toneladas. A próxima colheita gaúcha ingressa apenas em meados de outubro de 2024. Ou seja, o único estado com possibilidade de gerar grandes excedentes saiu da ponta vendedora do mercado para entrar na compradora. O Paraná, também com déficit de produção em relação à moagem, não terá a opção de aquisição dentro das fronteiras nacionais.
“Para a formação de preços, isso significa que a paridade de importação será a baliza para as cotações no mercado nacional: o preço que o produto importado chega aos moinhos nacionais determina o valor que o triticultor nacional poderá pedir pela sua produção. Nas duas últimas temporadas, a referência, em grande parte dos meses, foi a paridade de exportação, quando o preço nos principais fornecedores globais determina o valor que o produtor interno receberá. Historicamente, a indicação de paridade de importação supera a de exportação entre 20% e 25%. Somente por isso, já seria possível supor que os preços no ciclo comercial atual seriam superiores ao da temporada passada”, analisou.
Contexto global
Porém, também no contexto global, onde os preços recuaram de forma significativa de 2023, para 2024 é esperado uma maior estabilidade, com viés de alta. “Isso porque, os grandes fornecedores globais estavam corrigindo as altas exageradas que a invasão russa à Ucrânia ocasionou em 2022. Os números confirmam que o fluxo de comércio da região não sofreu declínio. Pelo contrário, ganhou participação em termos globais – os recordes de produção da Rússia compensaram o declínio ucraniano. Depois de corrigir o exagero, a tendência é de estabilização das cotações”, contextualizou.
No quadro fundamental, a próxima colheita do Hemisfério Norte, responsável por cerca de 90% do trigo colhido no mundo, ocorre apenas em meados de junho de 2024. Até lá, os preços globais devem repercutir o quadro de abastecimento 2023/24 e os números de produção da safra nova.
Argentina
A Argentina, principal fornecedor brasileiro e referência para os preços domésticos, terá um maior saldo exportável. No ciclo encerrado em novembro de 2023, vendeu menos de 4 milhões de toneladas ao exterior. No atual, o excedente em relação ao seu consumo interno é próximo a 8,5 milhões de toneladas. Esse volume seria suficiente para atender a necessidade de importação brasileira até julho/24 (estimada em 6,2 milhões de toneladas). “Todavia, os moinhos brasileiros não são os únicos clientes da Argentina. O cereal do vizinho é bastante competitivo em relação aos demais fornecedores quando o destino são os compradores do Sudeste asiáticos. Algo que chama a atenção é que os principais fornecedores para essa região da Ásia (a Índia e a Austrália) reduzirão a sua presença nas exportações globais”, salientou.
Com abalos nas produções de Índia e Austrália, é provável que os compradores asiáticos, incluindo os gigantes China e Indonésia, procurem maiores volumes de trigo junto de outros exportadores na América, na Europa e na região do Mar Negro. Entre esses compradores, os argentinos certamente serão assediados. “Com isso, para assegurar o abastecimento, os moinhos brasileiros podem ter que pagar mais, o que é mais um fator que corrobora para a percepção de preços mais firmes no Brasil”, pontuou.
Bento lembra que o reflexo das cotações internacionais no Brasil depende do comportamento cambial. “Os incontáveis fatores que podem afetar essa variável dificultam uma previsão. Porém, é consenso entre os principais economistas do país que, a exemplo do ano passado, ela não apresente uma amplitude significativa. Em 2023, essa amplitude foi de 8%. Na média dos cinco anos anteriores, 21%. Em Kansas, por exemplo, a amplitude das cotações em 2023 foi de 37%. Esses números mostram qual das variáveis tem o maior peso sobre a formação de preços domésticos”, finalizou.
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Gabriel Nascimento (gabriel.antunes@safras.com.br) / Agência SAFRAS
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